2007-04-20

Clínica Geral

Farmácias: mudanças em curso
Por José Figueiredo

Habituámo-nos a olhar para as farmácias e para o farmacêutico, como uma parte dos serviços de saúde. Desde sempre, que vamos à farmácia e perguntamos ao farmacêutico qual o melhor medicamento para a rouquidão, ou para uma dor de dentes.

Habituámo-nos também, a ouvir histórias sobre o estatuto social elevado do proprietário farmacêutico, sobretudo após o advento da Associação Nacional de Farmácias, que teve a sua génese motivada pela constante derrapagem nos pagamentos às farmácias, por parte do Ministério da Saúde.

Ou seja, a farmácia comunitária ou de oficina, tem um espaço social bem definido, ainda que o seu proprietário seja quase sempre um farmacêutico rico. Esta riqueza do farmacêutico (proprietário) teve a sua origem numa Lei da longínqua década de sessenta, em que se definia claramente um condicionamento à concorrência, isto é, o número de farmácias abertas ao público não podia aumentar, a não ser que a tal Lei fosse mudada.

Durante décadas, tivemos pois, um claro monopólio da venda de medicamentos para seres humanos (os medicamentos para animais têm regras diferentes), quer dos que são prescritos obrigatoriamente por médicos, quer dos que são livremente comprados.

A situação portuguesa do retalho de medicamentos não era única a nível internacional, embora fosse das que mais protegia um sub-sector de farmacêuticos: os proprietários de farmácias. A situação era mesmo, desequilibrada.

Com a chegada ao poder do actual governo, a situação alterou-se. Começou por se promover a venda de medicamentos de venda livre, fora do espaço das farmácias comunitárias ou de oficina. Apesar desta tentativa de liberalização, os resultados foram fracos. Supermercados, parafarmácias e outros retalhistas, não tiraram grande quota de mercado às farmácias.

Contudo, a tentativa de quebrar o monopólio dos proprietários de farmácia, não parou. O actual governo quer autorizar a abertura de mais farmácias, quer em hospitais, quer em espaços de rua. Recentemente, o novo Estatuto do Medicamento veio introduzir alterações que podem levar a promoções nos medicamentos de prescrição médica, conforme previsto no Decreto-Lei 65/2007.

Não sabemos até onde irão as tentativas para promover o aumento da concorrência no retalho farmacêutico, até porque já se especula numa futura liberalização da propriedade da farmácia, mas sabemos que nada ficará como dantes.

Num sector em que tudo esteve imóvel e positivo para aqueles que tinham a posse de farmácia, durante décadas, a instabilidade e a incerteza parece que vão perdurar.

Finalmente, um último elemento, as autoridades portuguesas ainda não dão relevância à venda de medicamentos através da Internet, algo que para nós, terá impactos crescentes, inevitavelmente.

Será que as farmácias no futuro manterão o seu papel como parte dos serviços de saúde?

José Figueiredo, autor da coluna Clínica Geral, é licenciado em Gestão de Empresas pelo ISCTE e pós-graduado em Marketing pela Universidade Católica Portuguesa. Possui vasta experiência profissional em empresas de vários sectores. É docente do Instituto Politécnico de Santarém, consultor na Allcare Management e investigador de doutoramento em Ciências Empresariais na Universidade do Minho.
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