«Três é a conta que Deus fez», diz o provérbio. E a sabedoria popular tem um enorme sentido. Por vários motivos.
Em primeiro lugar porque foram três, uma "troika" constituída pelo FMI, BCE e Comissão Europeia, a definir o futuro do país. Uns quantos economistas desembarcaram na Portela e discretamente, em menos de um mês, puseram no papel as condições para o país ter crédito.
Aquilo que em vários anos não conseguimos articular em ideias, quanto mais no papel, ficou relativamente claro. Ficou até mais claro e de forma mais rápida do que muitos programas eleitorais. Bem-haja a "troika" pelo empréstimo e pelas "sugestões".
Em segundo lugar porque são três os principais candidatos às legislativas. De entre estes três, dois concorrem inequivocamente para o lugar de Primeiro-Ministro, enquanto o outro tem sérias aspirações a um lugar de destaque no Conselho de Ministros.
Nenhum dos três vai contratar um dinamarquês de olhos azuis nem o melhor jogador chinês da actualidade. Mas quem quer que assuma o poder terá o controlo apertado dos credores. E é bom que assim seja. É bom que o próximo Governo tenha a "criatividade" limitada e que o vermelho da "troika" acenda sempre que a alguém lhe ocorra disparates como aqueles em que se transformou a política pública portuguesa dos últimos anos.
E assim também devia ser feito individualmente com as empresas públicas, municípios, regiões autónomas e demais entidades públicas que ao longo dos anos têm contribuído para o nosso descalabro. A "troika" devia instalar-se no Terreiro do Paço com acesso directo ao ministro das finanças. Não é de todo obrigatório ter na pasta um Oliveira Salazar ou um Cavaco Silva, ilustres ministros que não tinham olhos azuis mas que no seu tempo perceberam que as finanças públicas só se endireitavam se eles próprios assumissem o comando. E assim o fizeram.
Em terceiro lugar, três é a conta que Deus fez porque, de entre os debates televisivos, são três os que mais interessavam à partida: Sócrates – Passos Coelho; Passos Coelho – Portas; e Sócrates – Portas.
Os debates determinam o vencedor das eleições, diz-se. Infelizmente é assim: um toque de magia na TV vale mais do que um programa sério para a justiça ou para a educação. Daí que se tenha espreitado para alguns desses debates não com o intuito primeiro de ser esclarecido mas sim procurando compreender de que forma se produz o efeito duma breve conversa sobre uma escolha crucial para quatro anos. Não é fácil compreender. Mas como há pessoas que votam em quem mais se ri para elas ou lhes oferece um boné de campanha, então fica explicado porque é que 45 minutos de TV têm impacto.
Como três é a conta que Deus fez, estes debates foram repartidos por três canais de televisão. Ora, no primeiro dos três debates referidos – o que colocou Sócrates em confronto com Portas – tivemos um esclarecimento patriótico de Portas. Que nos sensibilizou para o facto de que não devemos dizer "troika" mas sim "triunvirato". O que para além de conferir ao cronista uma oportunidade para explorar o argumento central da peça, permitiu a Portas defender a língua portuguesa com aquele ar que oscila entre a pompa de Napoleão e o sorriso maroto de um miúdo.
E é assim a campanha eleitoral. Termina no dia três.