Em 27 de abril de 2011 publiquei nestas páginas uma crónica intitulada "A comunidade empreendedora" na qual dissertava sobre empreendedorismo comunitário. Afirmava então que o empreendedorismo comunitário ocorre quando uma comunidade desencadeia ações empresariais com vista a alcançar um resultado comum e partilhado pelos membros dessa comunidade. Hoje apresento ao leitor o caso prático duma ação desta natureza. Trata-se duma iniciativa desencadeada numa remota freguesia a que vou chamar Aldeia Bonita.
Aldeia Bonita está localizada no Minho. É uma freguesia pequena, longe de quase tudo. No Census de 2011 possuía exatamente 200 habitantes. Maioritariamente idosos, com tudo o que isso implica para a dinâmica populacional (ou para a falta dela).
A Junta de Freguesia local decidiu constituir uma bolsa de voluntariado para a qual aceita inscrições. De acordo com as palavras da própria junta, «a Bolsa de Voluntários pretende ser um mecanismo que permita aos cidadãos participarem e colaborarem, de forma não remunerada, em parte das atividades desenvolvidas pela autarquia local. Visa assim contribuir para a consciência colectiva dos problemas e para o compromisso na respectiva prevenção e solução com recurso ao voluntariado, fomentando um regime de prestação de serviço à Comunidade cada vez mais necessário para a promoção da melhoria da qualidade de vida dos cidadãos».
Assinalam-se também as áreas de intervenção da iniciativa: médicos e enfermeiros para prestação de cuidados primários de saúde; dinamizadores de aulas de ginástica e aeróbica; dinamizadores do rebanho comunitário; e técnicos e especialistas para palestras e ações de formação e divulgação nas áreas de saúde e bem-estar, agricultura, economia e finanças pessoais e familiares, bem como outros temas de interesse para a população.
Sem grande surpresa, é a saúde duma população predominantemente idosa que aparece em primeiro lugar. Mas as restantes áreas chamam também a atenção. Desde logo as ações de formação em temas diversos, incluindo a saúde e a agricultura, neste caso a principal fonte de rendimento local. Mas também a ideia do rebanho comunitário parece fazer todo o sentido num contexto de grande fragmentação da produção pecuária e agrícola.
Os problemas susceptíveis de serem solucionados através de iniciativas como esta são múltiplos. E o exemplo referido mostra que a saúde, a assistência social, a formação, a cultura, ou o desporto são áreas propícias para ações comunitárias. Também é verdade que algumas destas áreas – designadamente o desporto e a cultura – têm sido cobertas através de mecanismos mais convencionais como é o caso de muitas associações que, também elas, fazem um trabalho notável de voluntariado. Mas o certo é que as carências de hoje requerem modalidades diferenciadas de atuação. E o exemplo apresentado é prova disso.
A ilação que retiro deste exemplo é simples: as ações comunitárias fazem sentido e parecem recomendáveis que ocorram em áreas bem definidas, com objectivos claros de suprir carências locais.
Através do empreendedorismo comunitário, a rede de pessoas e organizações da comunidade local pode desencadear ações que articulam recursos diversos e dispersos. As necessidades que se sentem numa comunidade local não são normalmente difíceis de identificar. Difícil é conseguir identificar o potencial dos recursos aí existentes, sejam eles instalações diversas, património, equipamentos, natureza, ou a capacidade das pessoas, famílias e outras organizações que fazem parte da comunidade. E mais difícil ainda é mobilizar e articular esses recursos.
Independentemente da adesão que a bolsa de voluntários de Aldeia Bonita venha a ter, a ideia está ganha. Mas seria importante que se vissem resultados. Por simples que sejam, os resultados positivos mostram que o esforço vale a pena e é consequente. Se esse exemplo demonstrativo estiver presente e existirem iniciativas empreendedoras geradas localmente que vão de encontro a necessidades efectivas da comunidade, abre-se uma nova esperança.
Artigo publicado no Jornal de Barcelos de 14 de março de 2012.